sábado, 20 de novembro de 2010

A Situação Crítica


Na última viagem que fiz ouvi muitas críticas aos críticos (de cinema, em especial). Críticas que, infelizmente, na quase maioria dos casos se fazem valer.

Críticos são vistos como os imbecis vendidos que não entendem nada a respeito do processo de produção de uma obra de arte e, por algum motivo, sentem-se dignos da posição “confortável” de julgar o trabalho dos outros. São os boçais que dizem o que presta e o que não presta, que destroem ou glorificam uma obra de arte baseados nos mais escusos e vis interesses econômicos-morais-sociais.

Não existe faculdade de crítica, nem sequer de apreciação estética. Não existe cartilha de como analisar uma obra, mas sim um mundo de opções e caminhos a serem seguidos – escolha que é feita a partir de critérios perigosamente subjetivos. Para alguns se trata de analisar enredo e personagens, para outros se trata de identificar impactos sociais produzidos pela obra, para muitos se trata de contar a história do filme (ou livro, ou mesmo música) com um polegar pra cima ou pra baixo no fim do texto.

Mas e pra mim? A primeira certeza que me ocorre quanto à crítica é que ela deve ser impetuosa, sobretudo, consigo mesma. Um crítico sempre deve duvidar – principalmente de suas preferências e afinidades. A segunda certeza é que, ao menos para o crítico, a reflexão a respeito de uma obra de arte deve ser um desdobramento do processo de comunicação que é toda e qualquer apreciação artística. Afinal, alguém (artista) diz algo (obra de arte) para alguém (o apreciador, ou público). Assim, se alguém se propõe o trabalho de crítica não é nada honesto se conformar com juízos de valor, que são intrinsecamente particulares.

Não me entendam mal: juízos de valor são pontos de partida que podem, de fato, levar a reflexão a lugares interessantes e estimulantes. Mas se o público pode pura e simplesmente dizer “gostei” ou “não gostei”, o crítico jamais pode se beneficiar dessa concisão de opinião. Se chamamos artista àquele que se propõe a levar a sua(s) linguagem(ns) em alguma direção, deveríamos chamar crítico àquele que leva a reflexão sobre a arte para algum lugar, ou seja, que se faz essencial para a recepção de uma determinada obra.

Ora, Arte é uma das grandes formas de conhecimento inventadas pelo homem (entre muitas outras coisas que ela pode ser); aquilo que ela é capaz de produzir nas pessoas que se predispõem a enfrentá-la precisa ser encarado da mesma perspectiva. E a Arte não se interessa por preguiçosos – e estes tampouco se interessam verdadeiramente pela arte.

Por mais que eu considere juízos de valor pontos de partida promissores, não posso evitar de me interessar cada vez menos por eles. Hoje, para mim, frases como “eu faria diferente”, ou “isso não é cinema” são mil vezes mais desprezíveis do que a mais medíocre obra de arte. Afinal, se não concordo com a idéia de que o crítico não passa de um artista frustrado e invejoso, exijo do crítico a mesma coragem de exposição e criação que encontro na essência que torna alguém artista. Tem que tratar-se de um diálogo, nunca de um sermão.

Disposição, amor, tesão e auto-crítica são as raízes que sustentam a crítica que de fato me interessa. Claro, pode ser uma distração engraçada ver um crítico se resvalar em mil juízos de valores implicantes afim de defender única e exclusivamente as suas preferências mas, parafraseando de leve, deveríamos nos perguntar diante desse tipo de texto: “É engraçado, mas é crítica?”

Um comentário:

Mateus Moura disse...

O problema da Crítica são os "críticos", assim com o do Marx os "marxistas", e o do Freud os "psicanalistas"...

Volta e meia alguém tem que voltar pra essência... parabéns.

Críticos em estado crítico (eis a salvação), e cada qual andando com suas próprias pernas.